sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Literatura infantil

Livros e Infância

As histórias infantis como forma de consciência de mundo

É no encontro com qualquer forma de Literatura que os homens têm a oportunidade de ampliar, transformar ou enriquecer sua própria experiência de vida. Nesse sentido, a Literatura apresenta-se não só como veículo de manifestação de cultura, mas também de ideologias.
A Literatura Infantil, por iniciar o homem no mundo literário, deve ser utilizada como instrumento para a sensibilização da consciência, para a expansão da capacidade e interesse de analisar o mundo. Sendo fundamental mostrar que a literatura deve ser encarada, sempre, de modo global e complexo em sua ambigüidade e pluralidade.
Até bem pouco tempo, em nosso século, a Literatura Infantil era considerada como um gênero secundário, e vista pelo adulto como algo pueril (nivelada ao brinquedo) ou útil (forma de entretenimento). A valorização da Literatura Infantil, como formadora de consciência dentro da vida cultural das sociedades, é bem recente.
Para investir na relação entre a interpretação do texto literário e a realidade, não há melhor sugestão do que obras infantis que abordem questões de nosso tempo e problemas universais, inerentes ao ser humano.
"Infantilizar" as crianças não cria cidadãos capazes de interferir na organização de uma sociedade mais consciente e democrática.

Fases normais no desenvolvimento da criança

O caminho para a redescoberta da Literatura Infantil, em nosso século, foi aberto pela Psicologia Experimental que, revelando a Inteligência como um elemento estruturador do universo que cada indivíduo constrói dentro de si, chama a atenção para os diferentes estágios de seu desenvolvimento (da infância à adolescência) e sua importância fundamental para a evolução e formação da personalidade do futuro adulto. A sucessão das fases evolutivas da inteligência (ou estruturas mentais) é constante e igual para todos. As idades correspondentes a cada uma delas podem mudar, dependendo da criança, ou do meio em que ela vive.

Primeira Infância: Movimento X Atividade (15/17 meses aos 3 anos)

  • Maturação, início do desenvolvimento mental;
  • Fase da invenção da mão - reconhecimento da realidade pelo tato;
  • Descoberta de si mesmo e dos outros;
  • Necessidade grande de contatos afetivos;
  • Explora o mundo dos sentidos;
  • Descoberta das formas concretas e dos seres;
  • Conquista da linguagem;
  • Nomeação de objetos e coisas - atribui vida aos objetos;
  • Começa a formar sua auto-imagem, de acordo com o que o adulto diz que ela é, assimilando, sem questionamento, o que lhe é dito;
  • Egocentrismo, jogo simbólico;
  • Reconhece e nomeia partes do corpo;
  • Forma frases completas;
  • Nomeia o que desenha e constrói;
  • Imita, principalmente, o adulto.

Segunda Infância: Fantasia e Imaginação (dos 3 aos 6 anos)

  • Fase lúdica e predomínio do pensamento mágico;
  • Aumenta, rapidamente, seu vocabulário;
  • Faz muitas perguntas. Quer saber "como" e "por quê ?";
  • Egocentrismo - narcisismo;
  • Não diferenciação entre a realidade externa e os produtos da fantasia infantil;
  • Desenvolvimento do sentido do "eu";
  • Tem mais noção de limites (meu/teu/nosso/certo/errado);
  • Tempo não tem significação - não há passado nem futuro, a vida é o momento presente;
  • Muitas imagens ainda completando, ou sugerindo os textos;
  • Textos curtos e elucidativos;
  • Consolidação da linguagem, onde as palavras devem corresponder às figuras;
  • Para Piaget, etapa animista, pois todas as coisas são dotadas de vida e vontade;
  • O elemento maravilhoso começa a despertar interesse na criança.

Dos 6 aos 6 anos e 11 meses, aproximadamente

  • Interesse por ler e escrever. A atenção da criança esta voltada para o significado das coisas;
  • O egocentrismo está diminuindo. Já inclui outras pessoas no seu universo;
  • Seu pensamento está se tornando estável e lógico, mas ainda não é capaz de compreender idéias totalmente abstratas;
  • Só consegue raciocinar a partir do concreto;
  • Começa a agir cooperativamente;
  • Textos mais longos, mas as imagens ainda devem predominar sobre o texto;
  • O elemento maravilhoso exerce um grande fascínio sobre a criança.

Histórias para crianças (faixa etária / áreas de interesse / materiais / livros)

1 a 2 anos

A criança, nessa faixa etária, prende-se ao movimento, ao tom de voz, e não ao conteúdo do que é contado. Ela presta atenção ao movimento de fantoches e a objetos que conversam com ela. As histórias devem ser rápidas e curtas. O ideal é inventá-las na hora. Os livros de pano, madeira e plástico, também prendem a atenção. Devem ter, somente, uma gravura em cada página, mostrando coisas simples e atrativas visualmente. Nesta fase, há uma grande necessidade de pegar a história, segurar o fantoche, agarrar o livro, etc..

2 a 3 anos

Nessa fase, as histórias ainda devem ser rápidas, com pouco texto de um enredo simples e vivo, poucos personagens, aproximando-se, ao máximo, das vivências da criança. Devem ser contadas com muito ritmo e entonação. Tem grande interesse por histórias de bichinhos, brinquedos e seres da natureza humanizados. Identifica-se, facilmente, com todos eles. Prendem-se a gravuras grandes e com poucos detalhes. Os fantoches continuam sendo o material mais adequado. A música exerce um grande fascínio sobre ela. A criança acredita que tudo ao seu redor tem vida e vivência, por isso, a história transforma-se em algo real, como se estivesse acontecendo mesmo.

3 a 6 anos

Os livros adequados a essa fase devem propor "vivências radicadas" no cotidiano familiar da criança e apresentar determinadas características estilísticas.
Predomínio absoluto da imagem, (gravuras, ilustrações, desenhos, etc.), sem texto escrito, ou com textos brevíssimos, que podem ser lidos, ou dramatizados pelo adulto, a fim de que a criança perceba a inter-relação existente entre o "mundo real", que a cerca, e o "mundo da palavra", que nomeia o real. É a nomeação das coisas que leva a criança a um convívio inteligente, afetivo e profundo com a realidade circundante.
As imagens devem sugerir uma situação que seja significativa para a criança, ou que lhe seja, de alguma forma, atraente.
A graça, o humor, um certo clima de expectativa, ou mistério são fatores essenciais nos livros para o pré-leitor.
As crianças, nessa fase, gostam de ouvir a história várias vezes. É a fase de "conte outra vez".
Histórias com dobraduras simples, que a criança possa acompanhar, também exercem grande fascínio. Outro recurso é a transformação do contador de histórias com roupas e objetos característicos. A criança acredita, realmente, que o contador de histórias se transformou no personagem ao colocar uma máscara, chapéu, capa, etc..
Podemos enriquecer a base de experiências da criança, variando o material que lhe é oferecido. Materiais como massa de modelar e argila atraem a criança para novas experimentações. Por exemplo, a história do "Bonequinho Doce" sugere a confecção de um bonequinho de massa, e a história da "Galinha Ruiva" pode sugerir amassar e assar um pão.
Assim como as histórias infantis, os contos de fadas têm um determinado momento para serem introduzidos no desenvolvimento da criança, variando de acordo com o grau de complexidade de cada história.
Os contos de fadas, tais como: "O Lobo e os Sete Cabritinhos", "Os Três Porquinhos", "Cachinhos de Ouro", "A Galinha Ruiva" e "O Patinho Feio" apresentam uma estrutura bastante simples e têm poucos personagens, sendo adequados à crianças entre 3 e 4 anos. Enquanto, "Chapeuzinho Vermelho", "O Soldadinho de Chumbo" (conto de Andersen), "Pedro e o Lobo", "João e Maria", "Mindinha" e o "Pequeno Polegar" são adequados a crianças entre 4 e 6 anos.

6 anos a 6 anos e 11 meses

Os contos de fadas citados na fase anterior ainda exercem fascínio nessa fase. "Branca de Neve e os Sete Anões", "Cinderela", "A Bela Adormecida", "João e o Pé de Feijão", "Pinóquio" e "O Gato de Botas" podem ser contadas com poucos detalhes.



Fábulas (do latim- fari - falar e do grego - Phao - contar algo)

Narrativa alegórica de uma situação vivida por animais, que referencia uma situação humana e tem por objetivo transmitir moralidade. A exemplaridade desses textos espelha a moralidade social da época e o caráter pedagógico que encerram. É oferecido, então, um modelo de comportamento maniqueísta; em que o "certo" deve ser copiado e o "errado", evitado. A importância dada à moralidade era tanta que os copistas da Idade Média escreviam as lições finais das fábulas com letras vermelhas ou douradas para destacar.
A presença dos animais deve-se, sobretudo, ao convívio mais efetivo entre homens e animais naquela época. O uso constante da natureza e dos animais para a alegorização da existência humana aproximam o público das "moralidades". Assim apresentam similaridade com a proposta das parábolas bíblicas.
Algumas associações entre animais e características humanas, feitas pelas fábulas, mantiveram-se fixas em várias histórias e permanecem até os dias de hoje.
  • leão - poder real
  • lobo - dominação do mais forte
  • raposa - astúcia e esperteza
  • cordeiro - ingenuidade
A proposta principal da fábula é a fusão de dois elementos: o lúdico e o pedagógico. As histórias, ao mesmo tempo que distraem o leitor, apresentam as virtudes e os defeitos humanos através de animais. Acreditavam que a moral, para ser assimilada, precisava da alegria e distração contida na história dos animais que possuem características humanas. Desta maneira, a aparência de entretenimento camufla a proposta didática presente.
A fabulação ou afabulação é a lição moral apresentada através da narrativa. O epitímio constitui o texto que explicita a moral da fábula, sendo o cerne da transmissão dos valores ideológicos sociais.
Acredita-se que esse tipo de texto tenha nascido no século XVIII a.C., na Suméria. Há registros de fábulas egípsias e hindus, mas atribui-se à Grécia a criação efetiva desse gênero narrativo. Nascido no Oriente, vai ser reinventado no Ocidente por Esopo (Séc. V a.C.) e aperfeiçoado, séculos mais tarde, pelo escravo romano Fedro (Séc. I a.C.) que o enriqueceu estilisticamente. Entretanto, somente no século X, começaram a ser conhecidas as fábulas latinas de Fedro.
Ao francês Jean La Fontaine (1621/1692) coube o mérito de dar a forma definitiva a uma das espécies literárias mais resistentes ao desgaste dos tempos: a fábula, introduzindo-a definitivamente na literatura ocidental. Embora tenha escrito originalmente para adultos, La Fontaine tem sido leitura obrigatória para crianças de todo mundo.
Podem-se citar algumas fábulas imortalizadas por La Fontaine: "O lobo e o cordeiro", "A raposa e o esquilo", "Animais enfermos da peste", "A corte do leão", "O leão e o rato", "O pastor e o rei", "O leão, o lobo e a raposa", "A cigarra e a formiga", "O leão doente e a raposa", "A corte e o leão", "Os funerais da leoa", "A leiteira e o pote de leite".
O brasileiro Monteiro Lobato dedica um volume de sua produção literária para crianças às fábulas, muitas delas adaptadas de Fontaine. Dessa coletânea, destacam-se os seguintes textos: "A cigarra e a formiga", "A coruja e a águia", "O lobo e o cordeiro", "A galinha dos ovos de ouro" e "A raposa e as uvas".

Contos de Fadas

Quem lê "Cinderela" não imagina que há registros de que essa história já era contada na China, durante o século IX d. C.. E, assim como tantas outras, tem-se perpetuado há milênios, atravessando toda a força e a perenidade do folclore dos povos, sobretudo, através da tradição oral.
Pode-se dizer que os contos de fadas, na versão literária, atualizam ou reinterpretam, em suas variantes questões universais, como os conflitos do poder e a formação dos valores, misturando realidade e fantasia, no clima do "Era uma vez...".
Por lidarem com conteúdos da sabedoria popular, com conteúdos essenciais da condição humana, é que esses contos de fadas são importantes, perpetuando-se até hoje. Neles encontramos o amor, os medos, as dificuldades de ser criança, as carências (materiais e afetivas), as auto-descobertas, as perdas, as buscas, a solidão e o encontro.
Os contos de fadas caracterizam-se pela presença do elemento "fada". Etimologicamente, a palavra fada vem do latim fatum (destino, fatalidade, oráculo).
Tornaram-se conhecidas como seres fantásticos ou imaginários, de grande beleza, que se apresentavam sob forma de mulher. Dotadas de virtudes e poderes sobrenaturais, interferem na vida dos homens, para auxiliá-los em situações-limite, quando já nenhuma solução natural seria possível.
Podem, ainda, encarnar o Mal e apresentarem-se como o avesso da imagem anterior, isto é, como bruxas. Vulgarmente, se diz que fada e bruxa são formas simbólicas da eterna dualidade da mulher, ou da condição feminina.
O enredo básico dos contos de fadas expressa os obstáculos, ou provas, que precisam ser vencidas, como um verdadeiro ritual iniciático, para que o herói alcance sua auto-realização existencial, seja pelo encontro de seu verdadeiro "eu", seja pelo encontro da princesa, que encarna o ideal a ser alcançado.
Estrutura básica dos contos de fadas
  • Início - nele aparece o herói (ou heroína) e sua dificuldade ou restrição. Problemas vinculados à realidade, como estados de carência, penúria, conflitos, etc., que desequilibram a tranqüilidade inicial;
  • Ruptura - é quando o herói se desliga de sua vida concreta, sai da proteção e mergulha no completo desconhecido;
  • Confronto e superação de obstáculos e perigos - busca de soluções no plano da fantasia com a introdução de elementos imaginários;
  • Restauração - início do processo de descobrir o novo, possibilidades, potencialidades e polaridades opostas;
  • Desfecho - volta à realidade. União dos opostos, germinação, florescimento, colheita e transcendência.

Lendas (do latim legenda/legen - ler)

Nas primeiras idades do mundo, os seres humanos não escreviam, mas conservavam suas lembranças na tradição oral. Onde a memória falhava, entrava a imaginação para suprir-lhe a falta. Assim, esse tipo de texto constitui o resumo do assombro e do temor dos seres humanos diante do mundo e uma explicação necessária das coisas da vida.
A lenda é uma narrativa baseada na tradição oral e de caráter maravilhoso, cujo argumento é tirado da tradição de um dado lugar. Sendo assim, relata os acontecimentos numa mistura entre referenciais históricos e imaginários. Um sistema de lendas que tratem de um mesmo tema central constiruem um mito (mais abrangente geograficamente e sem fixação no tempo e no espaço).
A respeito das lendas, registra o folclorista brasileiro Câmara Cascudo no livro Literatura Oral no Brasil:
Iguais em várias partes do mundo, semelhantes há dezenas de séculos, diferem em pormenores, e essa diferenciação caracteriza, sinalando o típico, imobilizando-a num ponto certo da terra. Sem que o documento histórico garanta veracidade, o povo ressuscita o passado, indicando as passagens, mostrando, como referências indiscutíveis para a verificação racionalista, os lugares onde o fato ocorreu.
CASCUDO, 1978 , p. 51
A lenda tem caráter anônimo e, geralmente, está marcada por um profundo sentimento de fatalidade. Tal sentimento é importante, porque fixa a presença do Destino, aquilo contra o que não se pode lutar e demonstra o pensamento humano dominado pela força do desconhecido.
O folclore brasileiro é rico em lendas regionais. Destacam-se entre as lendas brasileiras os seguintes títulos: "Boitatá", "Boto cor-de-rosa", "Caipora ou Curupira", "Iara", "Lobisomem", "Mula-sem-cabeça", "Negrinho do Pastoreio", "Saci Pererê" e "Vitória Régia".
Nas primeiras idades do mundo, os homens não escreviam. Conservavam suas lembranças na tradição oral. Onde a memória falhava, entrava a imaginação para supri-la e a imaginação era o que povoava de seres o seu mundo.
Todas as formas expressivas nasceram, certamente, a partir do momento em que o homem sentiu necessidade de procurar uma explicação qualquer para os fatos que aconteciam a seu redor: os sucessos de sua luta contra a natureza, os animais e as inclemências do meio ambiente, uma espécie de exorcismo para espantar os espíritos do mal e trazer para sua vida os atos dos espíritos do bem.
A lenda, em especial as mitológicas, constitui o resumo do assombro e do temor do homem diante do mundo e uma explicação necessária das coisas. A lenda, assim, não é mais do que o pensamento infantil da humanidade, em sua primeira etapa, refletindo o drama humano ante o outro, em que atuam os astros e meteoros, forças desencadeadas e ocultas.
A lenda é uma forma de narrativa antiqüíssima, cujo argumento é tirado da tradição. Relato de acontecimentos, onde o maravilhoso e o imaginário superam o histórico e o verdadeiro.
Geralmente, a lenda está marcada por um profundo sentimento de fatalidade. Este sentimento é importante, porque fixa a presença do Destino, aquilo contra o que não se pode lutar e demonstra, irrecusavelmente, o pensamento do homem dominado pela força do desconhecido.
De origem muitas vezes anônima, a lenda é transmitida e conservada pela tradição oral.

Poesia

O gênero poético tem uma configuração distinta dos demais gêneros literários. Sua brevidade, aliada ao potencial simbólico apresentado, transforma a poesia em uma atraente e lúdica forma de contato com o texto literário.
Há poetas que quase brincam com as palavras, de modo a cativar as crianças que ouvem, ou lêem esse tipo de texto. Lidam com toda uma ludicidade verbal, sonora e musical, no jeito como vão juntando as palavras e acabam por tornar a leitura algo muito divertido.
Como recursos para despertar o interesse do pequeno leitor, os autores utilizam-se de rimas bem simples e que usem palavras do cotidiano infantil; um ritmo que apresente certa musicalidade ao texto; repetição, para fixação da idéias, e melhor compreensão dentre outros.
Pode-se refletir, acerca da receptividade das crianças à poesia, lendo as considerações de Jesualdo:
(...) a criança tem uma alma poética. E é essencialmente criadora. Assim, as palavras do poeta, as que procuraram chegar até ela pelos caminhos mais naturais, mesmo sendo os mais profundos em sua síntese, não importa, nunca serão melhor recebidas em lugar algum do que em sua alma, por ser mais nova, mais virgem (...)

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